Não há notícia de outro guitarrista e cantor de blues ter merecido edição tão sumptuosa: uma caixa com sete CDs, muita documentação escrita e visual (128 páginas dela!) e um livro de 112 páginas (escrito por John Fahey, o grande inovador da guitarra folk/country que enraízou o mais que pôde a sua arte na tradição e na história) explicam porque Charley Patton é uma das figuras mais seminais da música praticada no delta do Mississipi – e seminais, curiosamente, em domínios muitos distantes desta geografia musical e designadamente entre experimentalistas e improvisadores como Noel Akchoté e o português Manuel Mota. Algumas das gravações aqui recuperadas remontam aos anos 20 do século que passou e envolvem outros videospornogratis.net nomes a quem Patton esteve de alguma maneira ligado, como Walter Hawkins, Edith North Johnson, Henry Sims, Willie Brown, Son House, Louise Johnson, os Delta Big Four e Bertha Lee, além de músicos que pegaram no seu repertório da estirpe de Ma Rainey, Furry Lewis, Tommy Johnson, Howlin’ Wolf, Joe Williams e Staple Singers.

Muita da música ouvida, seja sob a forma original dos blues do Delta, com uma voz e uma guitarra simplesmente, ou com vestimentas de “vaudeville jazz” e de gospel, traz consigo a marca do tempo, com camadas maiores ou menores de estática e o crepitar da agulha nos velhos discos de 78 rpm de onde foi retirada. A “patine” não é um escolho para a fruição destas preciosidades da canção negra americana, antes lhes empresta uma dimensão existencial, de coisa vivida. Com uma voz enrouquecida pelo tabaco e pelo uísque, que consumia em grandes quantidades, a forma como cantava (como se tivesse berlindes na boca, diz-se) e tocava (entre o “finger-picking” e o “slide” com uma navalha) teve descendentes directos em Howlin’ Wolf, Robert Johnson e, mais recentemente, John Lee Hooker. Charley Patton também utilizava a madeira da guitarra em situações rítmicas e bucetas, um processo mais tarde adoptado por quantos desenvolveram técnicas extensivas para este instrumento – ouvi-lo a fazer isto há sete décadas faz-nos crer que a vanguarda, afinal, não acrescentou muito ao que indivíduos com o génio deste já faziam.